Tudo Sobre Animais

Animais marinhos venenosos

Desde os primórdios, o ser humano convive com animais, seja como caça, obtenção de algum material produzido por eles ou com o objetivo de estabelecer vínculos afetivos. Qualquer que seja a forma de convivência, pode resultar em acidentes, principalmente quando se trata de animais peçonhentos.1

Apesar da pouca atenção dada aos acidentes com animais marinhos peçonhentos no litoral do Brasil, alguns estudos mostram que a ocorrência é significativa. Por exemplo, um pesquisador constatou que em Ubatuba, litoral norte de São Paulo, um em cada mil atendimentos no pronto-socorro local era referente a acidentes com animais marinhos, um número alto quando se leva em conta que muitas pessoas que sofrem esse tipo de acidente não procuram auxílio médico.2

Animais marinhos podem ser peçonhentos ou venenosos. Os peçonhentos são aqueles que podem inocular toxinas através de ferrões e espinhos, como as arraias e bagres. Já animais marinhos venenosos são aqueles que possuem toxinas mas não possuem uma forma de inoculação. Nesses casos, o envenenamento pode ocorrer pela ingestão destes animais, que acumulam substâncias tóxicas em seus organismos, como os baiacus.3

Animais marinhos peçonhentos de importância médica

Os ouriços-do-mar, algumas espécies de águas-vivas e peixes podem ser considerados de importância médica porque através da ferroada podem produzir sintomas em seres humanos que determinam a necessidade de uma intervenção médica para neutralizar ou minimizar a ação da toxina injetada no corpo.1

esses acidentes podem ser vinculados, principalmente, ao trabalho pesqueiro, com o agravante da ausência de utilização de equipamento de proteção adequado, e de banhistas desavisados. Um estudo de 2003 mostrou que grande parte dos acidentes é provocada principalmente por ouriços-do-mar (50%), caravelas e águas-vivas são responsáveis por cerca de 25% dos acidentes e peixes, 25% - principalmente bagres pequenos que são jogados na praia por pescadores e pisados por banhistas.4

Ouriços-do-mar

Ouriço-do-mar-preto ou pinaúna (Echinometra locunter) debaixo da água

Ouriço-do-mar-preto ou pinaúna (Echinometra locunter). Imagem de Sascha Burgos sob a licença CC0 via iNaturalist.

A presença de ouriços-do-mar é marcante nas paisagens costeiras brasileiras. O ouriço-do-mar preto ou pinaúna (Echinometra locunter) é amplamente distribuído no litoral e causa um número expressivo de acidentes, sendo responsável por cerca da metade dos casos atendidos em serviços de emergência nas cidades costeiras. Embora menos frequente, o ouriço-do-mar verde (Lythechinus variegatus) também pode ocasionar acidentes. Ambas as espécies possuem veneno, mas a principal dificuldade no atendimento a esses casos reside na remoção dos espinhos.4

Os acidentes com ouriços-do-mar são considerados por muitos, causadores de lesões banais e não merecedoras de atenção especial. Assim, a maior parte das vítimas não procura atendimento médico e efetuam eles mesmos a retirada dos espinhos, passando por um procedimento doloroso e sem conhecimento de técnicas e materiais adequados. Isso provoca uma elevada taxa de insucesso, aumentando o risco de infecções e outras complicações, já que é comum que os espinhos quebrem, dificultando ainda mais sua retirada ou causando a falsa impressão de retirada completa.5

Aproximadamente 40% dos pacientes que não removem totalmente os espinhos desenvolvem nódulos dolorosos no local, apresentam febre e outros sintomas.4

Águas-vivas

Cobra-de-duas-cabeças (Zygaspis quadrifrons)

(A) Água-viva-leite (Chrysaora lactea) por Rodrigo Canalli. (B) Caravela-portuguesa (Physalia physalis) por Brett Ortler. (C) Vespa-do-mar (Chiropsalmus quadrumanus) por André Ambrózio. Imagens sob a licença CC-BY 4.0 via iNaturalist.

Certas espécies de caravelas frequentes nas regiões Norte e Nordeste e podem causar graves acidentes. Já nas regiões Sudeste e Sul, é comum o avistamento de pequenas medusas que causam acidentes menores, porém dolorosos. No entanto, no Brasil há duas espécies de vespas-do-mar relacionadas a acidentes fatais.

Sendo assim, a gravidade de um acidente com cnidários varia de acordo com a ação do veneno de cada tipo de animal (medusas, caravelas-portuguesas ou vespas-do-mar). Os casos mais leves são identificados por linhas de queimaduras e dor instantânea e intensa no local.4

Para o tratamento de acidentes com cnidários deve-se usar compressas de água do mar gelada e vinagre para controlar a dor no local atingido (a água doce não deve ser usada, pois agrava o envenenamento). Sintomas como dor local intermitentemente, tosse, coriza, falta de ar, arritmias ou taquicardia e outros, podem indicar quadros mais graves, sendo necessário buscar atendimento hospitalar.4

Peixes

Bragre-de-areia ou bagre-gonguito (Cathorops spixii) em rede de pesca

Bragre-de-areia ou bagre-gonguito (Cathorops-spixii). Imagem de Gabriel Jovencio Ribeiro sob a licença CC-BY-4.0 via iNaturalist

Há uma considerável diversidade de peixes venenosos nos rios e mares brasileiros. A maioria dos peixes que causam grande parte dos acidentes tanto em ambientes de água-doce quanto salgada são os mesmos, bagres e as arraias.3

Os acidentes com bagres de água salgada (família Ariidae) são os mais comuns no Brasil, mas peixes-escorpião (Scorpaena), peixes-sapo (Thalassophryne), arraias (vários gêneros) e outros, também causam acidentes com envenenamento. Todo acidente com peixes venenosos causa dor de intensidade variável e pode ocorrer necrose ocasional.4

Como dito anteriormente, os bagres de água salgada são os que mais causam acidentes relacionados a veneno, especialmente os mandis-chorões e os mandijubas — no entanto, são os casos considerados mais leves. Outros bagres de água doce possuem ferrão (como os pintados, jaús e armaus), mas não há evidências concretas de que contenham substâncias tóxicas.4

Raia-pintada (Aetobatus-narinari) vista por drone

Raia-pintada (Aetobatus-narinari). Imagem de Leonardo Merçon sob a licença CC-BY-NC-4.0 via iNaturalist.

Acidentes com arraias são considerados de intensidade média. Inversamente aos bagres, a toxina das arraias de água doce são muito mais perigosas do que as toxinas das arraias marinhas — especialmente a dor e a necrose local. Por esse motivo exigem maior atenção uma vez que pode incapacitar o indivíduo por meses e causar sequelas prolongadas.

Alguns dos peixes mais venenosos de todo o Brasil são os peixes-escorpião e os niquins ou peixes-sapo (Batrachoididae), comuns nas Regiões Norte e Nordeste. Os niquins vivem semienterrados na areia ou lodo e, quando pisados, injetam toxinas no corpo do agressor. 3

Os sintomas do envenenamento pelo peixe-sapo (niquim) incluem dor intensa e inchaço no local da picada, febre, perda de movimento e função motora no membro atingido. Em casos de complicações as sequelas podem ser incapacitantes, com a perda permanente da função do membro ou até mesmo a necessidade de amputação.6

Pacamão (Amphichthys cryptocentrus)

Pacamão (Amphichthys cryptocentrus). Imagem de Orione Álvares da Silva sob licença CC-BY-NC-SA-4.0 via iNaturalist.

Portanto, podemos observar que a gravidade dos acidentes com peixes variam: a dor causada por uma picada de arraia de água-doce ou peixe-escorpião é excruciante e perigosa, enquanto as lesões causadas por bagres e mandi são menos dolorosas. Sintomas como náuseas e vômitos, congestão pulmonar e arritmias cardíacas, podem ser observados em acidentes com arraias e peixes-escorpião.

Em caso de envenenamento por peixes, recomenda-se a aplicação de água quente (não fervente) no membro afetado, por um período de 30 a 90 minutos. O paciente deve ser encaminhado a um serviço de saúde para limpeza do ferimento e remoção de fragmentos do ferrão ou espinho, uma vez que infecções bacterianas são frequentes.

Além dos animais citados acima, no Brasil existem alguns moluscos, esponjas-do-mar, gastrópodes7 e vermes-marinhos que podem causar acidentes. Apesar disso, são casos isolados, raros e geralmente tratados com anti-histamínicos e pomadas.4

Acidentes provocados pela ingestão de peixes venenosos

Baiacu

Baiacu. Imagem de Ronaldo Guillen sob a licença CC-BY-SA-4.0 via Wikimedia Commons.

Alguns peixes, como o baiacu, são venenosos mas não peçonhentos. Isso significa que estes animais não contêm nenhum aparato especializado para inserir sua toxina. No entanto, sua carne é o que causa o envenenamento.

Ao contrário do que ocorre no Japão, a intoxicação por ingestão de baiacu é rara no Brasil. Ainda assim, é importante ressaltar que a limpeza do peixe, com extração de vísceras e pele, não garante segurança ao consumo, e os baiacus sempre serão perigosos quando ingeridos.3

A diversidade de espécies venenosas, como ouriços-do-mar, águas-vivas e peixes como os bagres e os peixes-sapo, destaca a importância de se reconhecer e tratar adequadamente os acidentes causados por esses animais. A gravidade dos envenenamentos, muitas vezes negligenciada pela falta de conscientização sobre os riscos e tratamentos adequados, pode levar a sérias complicações.

Embora existam poucos relatos de óbitos e envenenamentos graves causados pela ingestão de baiacus, a ciguatera (envenenamento provocado pela ingestão da carne de alguns peixes tropicais) já foi descrita na região Sudeste do Brasil. No entanto os relatos não foram publicados, e não há dados oficiais disponibilizados sobre este tipo de acidente no Brasil. Sendo assim, não é possível se ter uma real dimensão do problema.

A presença de humanos no ambiente marinho pode gerar situações de risco. No momento, os estudos clínicos no Brasil sobre as intoxicações e lesões provocadas por animais aquáticos são escassos. Não apenas isso, mas os acidentes com animais peçonhentos e venenosos ainda são subnotificados e pouco estudados. Portanto, é fundamental investir em pesquisas científicas, desenvolver soros e antivenenos específicos, além de promover campanhas de educação ambiental para prevenir acidentes e orientar a população sobre os primeiros socorros.


  1. BRAZIL, T. K., ed. Catálogo da fauna terrestre de importância médica na Bahia [online]. Salvador: EDUFBA, 2010. 204 p. ISBN: 978-85-232-1166-0. https://doi.org/10.7476/9788523211660↩︎

  2. Neves, R. F., Amaral, F. D., & Steiner, A. Q.. (2007). Levantamento de registros dos acidentes com cnidários em algumas praias do litoral de Pernambuco (Brasil). Ciência & Saúde Coletiva, 12(1), 231–237. https://doi.org/10.1590/S1413-81232007000100026  ↩︎

  3. Guia de animais peçonhentos do Brasil  ↩︎

  4. Haddad Junior, V. (2003). Animais aquáticos de importância médica no Brasil. Revista Da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, 36(5), 591–597. doi:10.1590/s0037-86822003000500009  ↩︎

  5. Junior, Vidal & NOVAES, STELLA & Miot, Helio & Zuccon, Alexandre. (2001). Accidents caused by sea urchins - The efficacy of precocious removal of the spines in the prevention of complications. Anais brasileiros de dermatologia. 76. 677-81. Online  ↩︎

  6. PESQUISADOR da Ufal descobre ação da peçonha dos peixes sapo e escorpião. 16 jul. 2016. Online . Acesso em: 30 dez. 2024. ↩︎

  7. Haddad Junior, Vidal. Animais aquáticos potencialmente perigosos no Brasil: guia médico e biológico. Brasil, Roca, 2008. Disponível aqui  ↩︎

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