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Diferenças e semelhanças entre polvos e lulas

Os moluscos pertencem ao segundo maior filo do mundo, com cerca de 93 mil espécies vivas confirmadas e até 200 mil espécies vivas estimadas, compreendendo, portanto, cerca de 23% de todos os seres marinhos conhecidos.

Os polvos e lulas fazem parte desse filo – mais especificamente, da sub-classe dos coleoides, que são popularmente conhecidos por seu corpo mole, possuir tentáculos e serem os invertebrados mais inteligentes.

Mas, apesar de serem muito semelhantes à primeira vista, há uma grande diferença não só entre lulas e polvos, mas também entre cada espécie. Os coleoides possuem uma grande variedade de tamanho, podendo ter apenas 10 mm, como é o caso da lula Idiosepius Thailandicus, até 14 m como a lula colossal — o maior invertebrado existente. A maioria, no entanto, não passa dos 60 cm.

Podem ser encontrados em todos os oceanos e ocupam desde águas rasas, até a grande parte das profundezas do oceano. E é nas águas brasileiras que está a maior diversidade do mundo.

Cor e camuflagem

A maioria dos coleoides possui componentes em sua pele que interagem com a luz, chamados iridóforos, leucóforos, cromatóforos e (em algumas espécies) fotóforos. Cromatóforos são células pigmentares coloridas que se expandem e contraem segundo a produção de cores e podem conter pigmentos amarelos, laranjas, vermelhos, marrons ou pretos; a maioria das espécies tem de duas a quatro dessas cores.

Cromatóforos de uma lula. Video via Gifer

Tanto polvos, quanto lulas possuem total controle dos cromatóforos presentes na sua pele: assim como conseguem mover um músculo, podem se camuflar rapidamente, sempre que quiserem. Essa mudança de cor pode ser feita em milissegundos, conforme seus cromatóforos são expandidos ou contraídos. Embora mudanças de cor pareçam depender principalmente da visão, há evidências de que os cromatóforos podem detectar a luz e se ajustar às condições luminosas independentemente da visão do animal.

A maioria dos polvos e lulas imitam estruturas selecionadas em seu campo de visão, por exemplo, há relatos de que o polvo Macrotritopus defilippi pode imitar a coloração e os movimentos de um linguado para evitar predadores, achatando seu corpo e colocando seus braços para trás para ter a mesma aparência que o peixe, assim como se mover com a mesma velocidade e movimentos do peixe. Além disso, também podem mudar a textura da pele, para uma semelhança ainda maior.

Os cromatóforos são encontrados por todo o corpo dos polvos e lulas, no entanto, eles são controlados pela mesma parte do cérebro que controla seu movimento durante a propulsão. Como resultado, não podem se camuflar enquanto nadam em grande velocidade, já que o cérebro é incapaz de controlar a natação e os cromatóforos simultâneamente.

Polvo iridescente. Video de OctoNation - Find & Share on Giphy

Os iridóforos e leucóforos no entanto, são pigmentos que refletem a luz utilizando placas reflexivas. Quando estas placas são iluminadas, geram cores iridescentes, e a direção em que estão essas placas é o que determina qual cor será refletida — assim como as penas de um beja-flor. Para os coleoides, além de fornecer camuflagem com seu plano de fundo, também conseguem confundir predadores que venham do fundo do mar, pois ao direcionar a luz para baixo podem fazer com que confundam seu brilho com o da superfície.

Os coleoides são capazes de se comunicar visualmente usando uma ampla gama de sinais. Para produzi-los, podem variar entre quatro tipos de formas de comunicação: cromáticos (coloração da pele), textura da pele (áspera ou lisa), postura e locomoção. Todos esses padrões de cores podem ser usados para se comunicarem ou alertarem outros polvos, para atrair presas, impressionar parceiros ou assustar predadores.

Além disso, quase todos os polvos e lulas possuem uma bolsa de tinta composta principalmente de melanina – que é liberada para confundir predadores, dificultando a visão, como uma cortina de fumaça.

Locomoção

Polvos e lulas são mais rápidos do que muitos peixes, ao criarem rajadas de alta velocidade, se tornaram mestres tanto em capturar presas, quanto fugir de seus predadores. Apesar disso, a anatomia entre esses dois grupos é muito diferente, especialmente em relação à sua locomoção.

Nos polvos, o manto (a região da cabeça) é constituído por três tipos de músculos: longitudinal, radial, e circular. Os três trabalham juntos para impulsionar o polvo na direção desejada. A propulsão a jato, o meio mais rápido de locomoção, é usada para escapar do perigo, mas é fisiologicamente ineficiente, exigindo uma pressão no manto tão alta que impede o coração de bater, resultando em falta de oxigênio.

Por essa forma de locomoção gasta muita energia, os polvos preferem se locomover rastejando vagarosamente, enquanto vasculham o fundo do mar ou nadar tranquilamente.

Polvo correndo. Video de Anafyn via Gifer

As lulas, por outro lado, são grandes nadadoras, e podem percorrer largas distâncias em relativamente pouco tempo. Apesar de não possuírem músculos longitudinais, possuem uma túnica rígida feita de camadas de colágeno que fazem seus músculos radiais se contrairem com mais força.

Pela fisiologia das lulas ser diferente e não gastar tanta energia, podem ser encontradas nadando de forma análoga aos peixes. Embora polvos e lulas possam se mover usando a propulsão, essa forma de locomoção é muito mais usada pelas lulas. Estas possuem um sifão que puxa água para uma cavidade do manto, através de uma válvula. Em seguida, uma grande quantidade de água é expelida em um jato forte e rápido, variando a direção da viagem segundo a orientação do funil.

Por isso, além de seus corpos serem hidrodinâmicos, são boas rivais dos peixes quando comparadas suas habilidades de natação e manobra — certas espécies podem até mesmo “voar” por curtas distâncias fora da água.

Braços e Tentáculos

As lulas possuem oito braços e dois tentáculos, que podem contrair ou expandir conforme necessário. Esses tentáculos possuem ventosas em suas pontas, assim como bordas endurecidas que podem conter pequenas garras.

O cachalote é um dos únicos predadores da lula-gigante. Na imagem é possível ver os arranhões que as lulas deixaram na cabeça da baleia ao tentarem fugir

A cachalote é um dos únicos predadores da lula-gigante. Na imagem é possível ver os arranhões que as lulas deixaram na cabeça da baleia ao tentarem fugir. Imagem de gringocurt via iNaturalist

Os polvos possuem 8 braços, que auxiliam na locomoção e na caça. Possuem um excelente tato e suas ventosas são equipadas com quimiorreceptores, para sentirem o gosto do que tocam. Um fato curioso é que podem realizar o processo de amputação espontânea em uma situação de perigo – como acontece com o rabo de muitos lagartos e com os caranguejos.

Inteligência

Estudos sobre a inteligência dos polvos, demonstram que possuem ótimas habilidades de aprendizado espacial e de manipulação de ferramentas tanto com relação à caça quanto à proteção.

As ventosas de alta sensibilidade e os braços preênseis dos polvos permitem-lhes segurar e manipular objetos. No entanto, ao contrário dos vertebrados, as habilidades motoras dos polvos não parecem depender de seus cérebros, já que a habilidade de organizar movimentos complexos não está ligada a braços específicos.

Polvo abrindo um pote. Video via Make a Gif

Os polvos podem resolver quebra-cabeças complexos que exigem ações de empurrar ou puxar, assim como abrir tampas de recipientes para obter o alimento dentro. Eles também podem se lembrar de soluções para quebra-cabeças e aprender a resolver o mesmo quebra-cabeça apresentado em diferentes configurações.

Acredita-se que as lulas sejam um pouco menos inteligentes do que os polvos, no entanto, várias espécies são muito mais sociais e exibem maior comunicação social, levando alguns pesquisadores a concluir que estejam no mesmo nível dos cães em relação à inteligência social.

Concha

Apesar de as lulas não possuírem concha, existe uma única espécie que a possui – a Spirula spirula. A característica mais distinta destas lulas é sua pequena concha interna com apenas 2,5 cm enrolada em forma de espiral, que controla sua flutuabilidade. Embora suas conchas sejam comuns em muitas praias de clima tropical e subtropical, é um animal raramente avistado.

Primeiro espécime de S. spirula encontrado vivo no mar. A lula está com o manto direcionado para baixo e seus tentáculos estão direcionados para cima.

Registo de S. spirula observada in situ pela primeira vez: (A) posição de repouso; (B) manto insuflado antes da fuga por propulsão; (C) posição de repouso; e (D) manto insuflado no início da fuga por propulsão. Imagem de schmidtocean.org

Apenas no dia 27 de outubro de 2020, um espécime vivo foi observado em seu habitat, pela primeira vez, através da câmera de um veículo submarino operado remotamente, pertencente ao Schmidt Ocean Institute .

Com relação aos polvos, existe uma família que também possuem conchas: os argonautas. Das sete espécies existentes, apenas duas habitam águas brasileiras: o Argonauta argo e o Argonauta nodosa, sendo A. argo o maior de todas as espécies da família.

Argonauta vivo, encontrado na areia da praia

Argonauta. Imagem de renehodges via iNaturalist

Suas conchas também servem como bolsa de ar dando-lhes certa flutuabilidade. Possuem um grande dimorfismo sexual e diferenças no tempo de vida: as fêmeas crescem até 10 cm e criam grandes conchas brancas e finas como papel de até 30 cm onde se enrolam e protegem seus ovos – uma argonauta com uma concha de apenas 8 cm, pode abrigar mais de 48 mil embriões.

Os machos, no entanto, possuem conchas escuras e são bem menores, raramente ultrapassando os 3 cm, por isso, só foram descritos no final do século XIX, enquanto as fêmeas são conhecidas desde a antiguidade. Além disso, os machos acasalam apenas uma vez em sua curta vida, por outro lado, as fêmeas podem ter crias muitas vezes.


A fauna de coleoides no Brasil ainda é pouco conhecida, porém, graças a alguns poucos pesquisadores, universidades e instituições voltadas ao mar, é que nos últimos 30 anos começaram a ser feitos desvendamentos e estudos de levantamento sobre as espécies que ocorrem ao longo da costa do Brasil.

Cerca de 810 espécies de cefalópodes são conhecidas no mundo, porém muitas identificações são duvidosas e precisam ser revistas. Na costa brasileira há 86 espécies registradas, sendo assim, cerca de 10% de todas as espécies de cefalópodes conhecidas no mundo ocorrem aqui.

Leia mais em:

Oceanic Bioluminescence: an Overview of General Functions

Mechanisms and behavioral functions of structural coloration in cephalopods

Do cephalopods communicate using polarized light reflections from their skin?

Cephalopod Camouflage: Cells and Organs of the Skin

Bioluminescent Countershading in Midwater Animals: Evidence from Living Squid

Fact or Fiction: Can a Squid Fly out of Water?

A Study in Jet Propulsion: An Analysis of the Motion of the Squid, Loligo Vulgaris

A “Mimic Octopus” in the Atlantic: Flatfish Mimicry and Camouflage by Macrotritopus defilippi

Ramirez MD, Oakley TH. Eye-independent, light-activated chromatophore expansion (LACE) and expression of phototransduction genes in the skin of Octopus bimaculoides. J Exp Biol. 2015 May 15;218(Pt 10):1513-20. doi: 10.1242/jeb.110908 . PMID: 25994633; PMCID: PMC4448664.

Evidence for light perception in a bioluminescent organ

Visual phototransduction components in cephalopod chromatophores suggest dermal photoreception

Lulas e polvos da costa brasileira

The First In Situ Observation of the Ram’s Horn Squid Spirula spirula Turns “Common Knowledge”Upside Down

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