Tudo Sobre Animais

A inteligência dos golfinhos

Os golfinhos são mamíferos marinhos que pertencem à mesma família (Delphinidae) que as orcas. De fato, não há uma grande separação entre golfinhos e orcas, sendo muitas vezes consideradas apenas como “golfinhos grandes”, que diferem apenas com relação ao gênero.

Há cerca de 37 espécies de golfinhos que variam desde 1,2 m (golfinho-de-maui) até os 9 m das orcas. No Brasil, aproximadamente 11 espécies podem ser avistadas. Por serem animais que vivem em alto-mar, há muitas espécies que ainda não foram devidamente estudadas, mas as mais comuns como as orcas, o golfinho-nariz-de-garrafa e o golfinho-roaz-do-Indo-Pacífico nos deram muitas informações impressionantes sobre seus hábitos.

Os golfinhos se alimentam principalmente de peixes e cefalópodes (variando conforme a espécie), já as orcas podem se alimentar também de outros mamíferos, aves, tartarugas-marinhas e inclusive de baleias maiores. Diferentes populações ou ecótipos podem se especializar em presas distintas dependendo da região em que vivem.

Sendo animais sociais, estão sempre em grupos que podem variar desde apenas alguns membros, até milhares de indivíduos, como acontece durante o período de migração de muitos golfinhos — esta formação maior, no entanto, costuma ser temporária.1

Altruísmo e afetividade

Grupo com 7 Golfinhos-Rotadores (Stenella longirostris) vistos de cima

Golfinho-Rotador (Stenella longirostris). Imagens de Craig Fujii sob a licença CC-BY-NC-ND via iNaturalist.

Os golfinhos são um dos animais mais inteligentes, sendo capazes de ensinar, aprender, cooperar, planejar e lamentar.2 Eles estabelecem fortes laços sociais e ficarão com membros feridos ou doentes, ajudando-os a respirar e trazendo-os à superfície se necessário. Este comportamento pode ser visto inclusive quando se trata de outras espécies.

Um golfinho da Nova Zelândia, por exemplo, foi observado guiando um cachalote fêmea com seu filhote para fora de águas rasas, onde encalharam várias vezes.3 Também há relatos de golfinhos protegendo nadadores de tubarões4 5, e brincando com cães e cavalos.

As orcas também podem demonstrar apego e cuidado com os membros de seu grupo, algumas já foram vistas acompanhando companheiros capturados por pescadores por muitos quilômetros. Outras também foram observadas carregando seus filhotes mortos por vários dias, o que pode sugerir o sentimento de sofrimento e luto. O comportamento não é relatado com frequência, e as dificuldades em observar estes animais em vida selvagem resultam em uma pequena amostra de incidentes verificáveis; há muito mais a aprender sobre as respostas dos golfinhos e das baleias com relação à morte.6

Pesquisas revelaram uma série de comportamentos sociais entre os cetáceos, especialmente se tratando de orcas e golfinhos, como o cuidado, o uso de ferramentas, o ensino e a transmissão de comportamentos entre gerações.

Cultura, aprendizado e inteligência

Grupo de golfinhos-nariz-de-garrafa saltando para fora da água

Golfinhos-nariz-de-garrafa. CCO via iNaturalist.

Segundo o dicionário, cultura pode ser definida como:

  1. Conjunto dos conhecimentos adquiridos de uma pessoa ou grupo;
  2. Totalidade dos costumes, das tradições, das crenças, dos padrões morais, das manifestações artísticas e intelectuais e de outras características que distinguem uma sociedade ou grupo social;
  3. Conjunto das características morais, intelectuais, artísticas e dos costumes ou tradições de um determinado povo, nação, lugar ou de um período específico.7

Até alguns anos, acreditava-se que a cultura era algo exclusivo dos humanos, uma das principais características que nos diferenciavam dos animais. Porém, seguindo os conceitos citados acima podemos presumir que algumas espécies de animais também possuem cultura.

A cultura animal pode ser definida como a capacidade dos animais de aprender e transmitir comportamentos, e pode envolver a transmissão de novos comportamentos ou variações regionais independentes de fatores genéticos ou ecológicos. De fato, as orcas e demais golfinhos de diferentes regiões possuem diferentes padrões comportamentais.

Um exemplo famoso é o caso de 2005, no qual pesquisadores na Austrália observaram pela primeira vez um golfinho-roaz-do-Indo-Pacífico (Tursiops aduncus) ensinando seus filhotes a usarem esponjas-do-mar para melhorar sua eficiência na captura de presas escondidas no substrato marinho.8

Este comportamento demonstra que são capazes de passar por adaptações comportamentais complexas, além de uma capacidade única de aprendizado e transmissão cultural entre as gerações.9

Anos antes, golfinhos de vida livre desta espécie foram vistos exibindo uma forma de nadar não natural e vista apenas dentro dos aquários. Esta atividade imita uma postura em pé, com o corpo fora da água, enquanto usa apenas a cauda para correr para trás ao longo da água. 10

O comportamento foi observado inicialmente em 1988, quando uma fêmea foi resgatada e passou duas semanas se recuperando com golfinhos em cativeiro. Lá, observou os golfinhos cativos caminhando com cauda e após retornar ao mar, continuou a realizar esse truque que aprendeu por conta própria. No mar, outros golfinhos aprenderam a fazer o mesmo e duas décadas depois este comportamento continuou sendo observado nesta espécie.11

A partir desdas observações e de muitas outras pode ser constatado que o aprendizado dos golfinhos através da observação de determinada técnica lúdica, de caça ou de comunicação pode perdurar por várias gerações, podendo se tornar parte da cultura daquele grupo específico.9

A imitação também foi considerada um dos modos mais prevalentes de transmissão cultural em animais, já o ensino e a linguagem são muito menos difundidos, com as possíveis exceções de primatas, baleias e golfinhos.

Orcas têm sotaque

Orcas residentes do sul caçando salmão

Orcas residentes do sul caçando salmão. Imagem da NOAA via Wikimedia Commons.

As Orcas Residentes do Norte (NRKW) e as Orcas Residentes do Sul (SRKW), são duas populações de orcas que habitam áreas diferentes ao longo da costa oeste da América do Norte. Ambas as populações (porém, não apenas) desenvolveram dialetos distintos, transmitidos culturalmente e usados para comunicação apenas dentro de seus grupos sociais, sendo essenciais para manter a coesão e coordenar atividades de grupo.

A população SRKW é conhecida como “orcas comedoras de peixes”, pois, ao contrário de outras orcas, se alimentam exclusivamente de peixes – principalmente salmão. A pesquisa que revelou sobre os dialetos das orcas, concluiu que “ganhar a vida” apenas com salmão requer, sem dúvida, conhecimento especializado transmitido de geração em geração. Sendo assim, a sobrevivência destas orcas é melhorada ao permanecer no seu grupo aprender as tradições comportamentais.

No entanto, dialetos não são características únicas das orcas, outras espécies de golfinhos e algumas baleias possuem dialetos (assim como certas espécies de pássaros e de símios). A comunicação entre cetáceos nos mostram características surpreendentes sobre inteligência e socialização marinha.

Enquanto pesquisas afirmam que as orcas e algumas baleias como a jubarte e cachalote desenvolveram dialetos distintos entre populações que vivem em diferentes partes do oceano, 12 os golfinhos-nariz-de-garrafa exibem memória excepcional e os chamados “assobios de assinatura”.

Golfinhos possuem “nomes”

Biguá

Golfinho-comum (Delphinus delphis). Imagem de Charlotte Kirchner sob a licença CC-BY via iNaturalist.

Somente na última década foi descoberto que os golfinhos-nariz-de-garrafa têm assobios de assinatura, um assobio que é exclusivo de um indivíduo específico, facilitando as interações sociais. Esse comportamento pode ser crucial para a coesão e a comunicação eficaz dentro dos grupos de golfinhos-nariz-de-garrafa. Pode-se dizer que o assobio de assinatura equivale a um nome. 13

Os golfinhos-nariz-de-garrafa têm uma memória forte quando se trata desses assobios de assinatura, pois através de seu uso são capazes de se lembrar de um indivíduo que não encontram há mais de vinte anos. 14 Levando essa informação em consideração, é possível afirmar que estes golfinhos têm a memória mais longa já conhecida em qualquer espécie que não seja a dos humanos. Similarmente, os cetáceos estão no topo de qualquer lista de animais mais inteligentes, ao lado de grandes símios e dos humanos.

Ameaças

Mesmo com a diminuição da matança de cetáceos na caça às baleias, novos dilemas surgiram de forma paradoxal. A caça excessiva às suas presas, a poluição, o aquecimento global, os derramamentos de óleo em grande escala são as ameaças mundiais mais significativas.

Cetáceos como as baleias e golfinhos são muito sensíveis aos sons, pois dependem dele para se comunicar e caçar, sendo assim, a perturbação causada por ruído e conflitos com barcos pesqueiros ou de turismo podem prejudicar sua comunicação e atrapalhar a sobrevivência detes animais.15.

O uso de sonares em navios e submarinos também são uma ameaça, havendo diversos relatos de baleias (inclusive orcas) encontradas mortas após testes de sonares militares.16

Além das ameaças citadas acima, os golfinhos também são vítimas da pesca acidental e intencional, visto que em diversos países como o Japão, Noruega e Islândia a caça aos golfinhos e baleias pequenas ainda é legalizada. 17

Conclusão

Biguá

Golfinho-de-Laterais-Brancas-Do-Pacífico (Sagmatias obliquidens). Imagem de Sergio Martínez sob a licença CC BY-NC via iNaturalist.

Os golfinhos são os cetáceos com o maior repertório social, tendo os grupos mais unidos e a comunicação sonoramente mais complexa. Apesar da relativa escassez de informações sobre muitas espécies de golfinhos (e de várias espécies de baleias), é importante notar que estes animais possuem padrões sociais com grandes habilidades de comunicação e diversos dialetos, assim como a formação de alianças, cooperação, transmissão cultural e uso de ferramentas. 4

A inteligência está intimamente ligada à capacidade de comunicação e linguagem. Seres inteligentes podem desenvolver sistemas de comunicação mais elaborados, incluindo linguagem verbal e não verbal, essenciais para a transmissão de informações e a formação de cultura.

As técnicas de alimentação deste animais são muito variáveis, adaptáveis e com técnicas de caça complexas e cooperativas. Essa variabilidade e adaptabilidade também permitiram que aproveitassem as novas fontes de alimentos antropogênicas à medida que se tornavam disponíveis, exibindo uma forma de desenvolver e adaptar sua cultura para enfrentar desafios ambientais. 9

Apesar de todas as evidências, nem todos os estudiosos aceitam que estas análises comportamentais ou que muitas outras já documentadas sejam o suficiente para confirmar que possuem cultura. Infelizmente, estudos que comprovem tal afirmação podem nunca ser realizados devido ao custo e à dificuldade de manter e criar a maioria dos cetáceos em condições controladas e que ainda mantenham suas características e necessidades naturais para que os animais possam demonstrar um comportamento social realista.9

Ainda há muito a ser descoberto sobre o comportamento dos cetáceos sob as ondas, e o estudo cuidadoso dos golfinhos e das baleias em seu habitat poderia revelar uma série de outras habilidades sociais e cognitivas até então desconhecidas. De fato, o estudo destes animais em cativeiro confirmou que apresentam habilidades que superam as de qualquer outro animal, já que em alguns testes, os golfinhos superaram até mesmo os chimpanzés.15


  1. Thousands of Dolphins Form ‘Mega Pod’ in California’s Monterey Bay  ↩︎

  2. Watching Whales Watching Us  ↩︎

  3. Dolphin Saves Stuck Whales, Guides Them Back to Sea  ↩︎

  4. Dolphins save swimmers from shark  ↩︎

  5. Amizade inusitada’: cachorro e golfinho brincam juntos  ↩︎

  6. Whale and dolphin behavioural responses to dead conspecifics  ↩︎

  7. Priberam - Cultura  ↩︎

  8. Cultural transmission of tool use in bottlenose dolphins  ↩︎

  9. Why Do Dolphins Carry Sponges?  ↩︎

  10. The incredible tale of Billie the Port River dolphin — the world’s first wild tailwalker  ↩︎

  11. Tail walking in a bottlenose dolphin community: the rise and fall of an arbitrary cultural ‘fad’  ↩︎

  12. Culture in whales and dolphins  ↩︎

  13. Bottlenose dolphins can use learned vocal labels to address each other  ↩︎

  14. Decades-long social memory in bottlenose dolphins  ↩︎

  15. IUCN - Killer Whale  ↩︎

  16. U.S. Navy Sonar May Harm Killer Whales, Expert Says  ↩︎

  17. Após governo reautorizar caça às baleias, dois primeiros animais são mortos na Islândia  ↩︎

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