Inteligência e memória dos peixes
Os peixes são um dos animais mais utilizados pelos seres humanos, sendo parte das indústrias pesqueiras globais e cultivados na aquicultura. Também são um dos animais mais usados em pesquisas científicas e um dos animais de estimação mais comuns, porém, raramente recebem o mesmo nível de compaixão ou bem-estar que os mamíferos e aves.
Em comparação a esses animais, os peixes estão filogenicamente muito distantes dos humanos, por isso, pode ser mais difícil sentirmos empatia por eles. Não podemos ouví-los vocalizando, e faltam-lhes expressões faciais, ambas características primordiais para despertar a empatia humana. Da mesma forma, é difícil percebermos sinais comportamentais que indiquem um bem-estar deficiente.
Todas essas diferenças se devem, em partes, à grande barreira entre a visão que as pessoas têm da inteligência dos peixes e a realidade científica. Muitos ainda os consideram “menos animais”, pensando que não são inteligentes, que não sentem dor ou que não são sensatos o suficiente, apesar disso, tal percepção vem mudando nos últimos anos.
Várias observações sugerem que os peixes são, de fato, muito mais inteligentes do que nós lhes damos crédito. Revisões recentes sobre a inteligência dos peixes revelam vários comportamentos sofisticados.
Peixes têm boa memória
Novas evidências sugerem que apesar da aparência, o cérebro dos peixes também é mais semelhantes ao cérebro humano do que pensávamos anteriormente. Na maioria das espécies, seus cinco sentidos são tão bons quanto ou melhores do que os nossos. Ao comparar seu comportamento com o dos primatas, encontramos muito poucas diferenças.
Ao contrário da velha história que diz que a memória dos peixes dura apenas três segundos, muitos estudos demonstram que podem lembrar de coisas por dias, meses e até mesmo anos — embora tal capacidade certamente varie entre espécies e contextos. Pesquisas sobre a capacidade de retenção e duração da memória demonstram que a memória dos peixes é comparável ao que vemos em vertebrados terrestres.
Peixes se lembram de onde estiveram
A memória espacial tem sido amplamente estudada em peixes. Os gobies (Gobius paganellus) são um exemplo clássico quando se trata de memória espacial em peixes: na maré baixa, podem evitar a predação saltando em piscinas maiores próximas com impressionante precisão, esse hábito sugere que aprendem o mapa espacial de seu entorno durante a maré alta, e se lembram desta informação por pelo menos quarenta dias. 1
Muitos peixes realizam grandes migrações que envolvem a capacidade de memorização espacial. Várias espécies de salmões fazem migrações quando juvenis de seu riacho natal em direção ao mar e novamente como adultos em uma viagem de volta ao seu riacho natal. Estes peixes gravam sinais olfativos de seu riacho e se lembram desta informação meses ou anos mais tarde quando voltam para casa.2
Peixes se lembram de outros peixes
A maioria dos peixes vive em grupos sociais durante a maior parte de suas vidas, e não deve ser surpresa que também apresentem todos os tipos de comportamentos indicativos de inteligência social.
Grupos sociais de animais são raramente compostos de uma seleção aleatória de indivíduos e este também é o caso dos peixes. Geralmente os peixes formam cardumes relativamente estáveis e se familiarizam com os indivíduos dentro desse grupo.
Os guppies podem identificar até 15 indivíduos com pouca dificuldade. Em cardumes relativamente pequenos, a familiaridade leva cerca de 10 dias para se desenvolver e pode ser mantida mesmo após 5 semanas de isolamento. Em humanos, a capacidade de reconhecimento individual se desenvolve entre 6 e 10 meses.
Além de terem excelente memória a longo prazo, desenvolveram tradições complexas ensinadas de um indivíduo para o outro. Também mostram sinais de que sabem enganar outros peixes, assim como podem cooperar entre si. Os peixes podem lembrar os atributos de outros indivíduos, como sua capacidade competitiva ou comportamento passado, e modificar seu próprio comportamento baseado nisso.
Por exemplo, podem lembrar de indivíduos para os quais perderam em uma luta e evitá-los no futuro; ou podem reconhecer vizinhos territoriais e mostrar menos agressão em comparação com estranhos. Podem também, reconhecer indivíduos em cuja companhia obtiveram menos alimentos no passado e associar-se preferencialmente a novos parceiros no futuro.1
Além disso, os peixes não apenas reconhecem uns aos outros como reconhecem até mesmo humanos (no caso de serem animais de estimação).3
Embora sua história evolutiva e o desenvolvimento de seus cérebros difiram do de outros animais, é evidente que o cérebro dos peixes consegue executar funções semelhantes à dos vertebrados. Podemos concluir, portanto, que se outros animais são conscientes de si próprios, então deve-se concluir que os peixes também o são.
Nossa percepção da inteligência de um animal define em grande parte a maneira como os tratamos quando interagimos com eles. Seu nível de inteligência define se eles são ou não seres sencientes, portanto, dignos de serem incluídos em nosso “círculo moral”.
Além deste conjunto de evidências sugerir fortemente que os peixes são inteligêntes e têm consciência, estudos recentes também responderam uma das questões mais controversas na biologia dos peixes e na ética animal em geral, que é se os peixes sentem dor.
Segundo um estudo publicado por Culum Brown, biólogo da Universidade Macquarie, na Austrália é possível afirmar que: Não há absolutamente nenhuma dúvida de que os peixes têm todo o sistema associado à percepção da dor. De fato, se examinarmos os receptores de dor nos peixes, encontraremos uma semelhança notável com os dos seres humanos
.
Evidências sugerem fortemente que os peixes são inteligêntes e sencientes, além disso, as evidências de que são capazes de sentir dor de uma forma semelhante à dos seres humanos aumenta gradualmente. Portanto, há muitas razões para dar aos peixes a atenção e o cuidado que merecem.1
Referências: