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Como as cobras rastejam

Há milhares de anos, existiu em solo brasileiro junto a muitos dinossauros, uma espécie de serpente com pernas: a Tetrapodophis — um animal muito pequeno quando a comparado aos grandes animais da época.

Identificada em 2015, sua descoberta pode ser revolucionaria, já que sugere que as serpentes evoluíram de animais escavadores e não marinhos como se pensava anteriormente. Até o momento pouco se conhece sobre a Tetrapodophis e estudos ainda precisam ser realizados para registrá-la adequadamente como um ancestral das serpentes.

Porém, uma coisa é certa: esse é o animal mais antigo com quatro patas relacionado às serpentes. Desde quando caminhavam pelo Brasil suas patas já eram muito pequenas, e segundo o paleontólogo David Martill, o animal provavelmente já se movia rastejando, e suas patas supostamente ajudariam apenas a agarras suas presas.

Fóssil do ancestral das cobras - Tetrapodophis no Museu de História Natural de Solnhofen na Alemanha. É possível ver suas patas dianteiras e traseiras.

Fóssil de Tetrapodophis no Museu de História Natural de Solnhofen na Alemanha. Imagem de Ghedoghedo via Wikimedia Commons

Um estudo publicado na Current Biology por Martin J. Cohn e Francisca Leal em 2016 demonstrou uma grande descoberta: as cobras não perderam suas pernas através de anos de evolução e sim, tiveram o gene responsável pelo desenvolvimento de suas patas desativado. Ou seja, se este gene for reativado, todas as cobras poderiam ter patas novamente. Da mesma forma, se este gene for desativado em outros animais, suas patas seriam atrofiadas.

Em cobras como pítons e jiboias , no entanto, esse gene está ativo apenas no começo da gestação. Isso explica porque algumas delas possuem pequenas “garras” projetando-se da pele – são ossos vestigiais – que não se desenvolveram adequadamente.

Apesar de não sabermos exatamente quando este gene se tornou inativo, nenhuma serpente atual tem patas. Mesmo assim, puderam adaptar sua locomoção aos mais diversos biomas e modos de vida, rastejando pelo chão das matas e florestas, em árvores, desertos e inclusive em ambientes aquáticos.

De acordo com um estudo de David Hu — professor de engenharia mecânica no Instituto de Tecnologia da Geórgia em Atlanta, as cobras atuais precisam da fricção fornecida pelas escamas em sua barriga, para poderem se locomover (onde a resistência é maior que a do resto do corpo). Além disso, usam as irregularidades encontradas no solo como gravetos, pedras e relevos como suporte e fonte de propulsão. Portanto, as serpentes têm muito mais facilidade em deslizar por superfícies ásperas que possuem mais atrito, do que em superfícies muito lisas.

Além disso, segundo uma equipe de pesquisadores da Universidade do Óregon, a evolução deu aos répteis uma concentração de “moléculas gordurosas” nas escamas da barriga, tornando-as mais oleosas do que as encontradas em outras partes do corpo e reduzindo o atrito da região. Essa lubrificação ajuda a locomoção e reduz os danos à pele. A origem dessa lubrificação, no entanto, continua sendo um mistério.

Diferentes modos de locomoção estão associados principalmente a diferentes superfícies. Apesar de alguns estudiosos afirmarem haver muitos tipos, a locomoção das serpentes têm sido categorizada por muitos anos como quatro modos principais: retilínes, concertina, ondulação lateral — também conhecida como “serpentina” e locomoção por alças laterais. Uma única serpente pode usar a maioria ou todos os quatro modos dependendo da necessidade.

Retilínea

Locomoção retilínea. Via gifs

Está associada principalmente às serpentes grandes e pesadas como jiboias que se movimentam lentamente em linha reta — no entanto, a maioria das serpentes pode se mover dessa forma, sendo uma das maneiras de locomoção mais comuns. É utilizado principalmente quando o espaço atravessado é muito apertado para permitir outras formas de movimento.

Embora pareça que as costelas se movem num padrão de “marcha”, foi comprovado que esse não é o caso, apenas os músculos e a pele se movem para impulsionar o animal. Na locomoção retilínea as escamas da barriga são alternadamente levantadas ligeiramente do chão e puxadas para a frente e, em seguida, puxadas para baixo e para trás, arrastando assim, seu corpo pelo solo. Depois que o corpo se move o suficiente para a frente, a pele e os músculos se movem novamente levando o corpo adiante.

Este método de locomoção é extremamente lento, mas também, quase silencioso e muito difícil de ser detectado, tornando-o a melhor escolha para muitas espécies quando perseguem presas. Além disso, também pode ser útil após comerem, tendo em vista que as serpentes têm mais dificuldade em dobrar a coluna após engolirem presas grandes, e o movimento retilíneo requer menos flexão da coluna do que outros modos de locomoção.

Serpentina

Locomoção serpentina. Via gifs

A serpentina é a locomoção mais comum das serpentes. Elas movem seu corpo em formato de “S”, com ondas que se espalham ao longo de todo corpo — desde a cabeça à cauda. À medida que a cobra avança, cada parte de seu corpo segue o caminho estabelecido pela cabeça, como os vagões de um trem seguindo trilhos.

Nesse modo, o corpo da cobra empurra contrapontos de contato no ambiente, como rochas, galhos, irregularidades no solo, etc. Cada um desses objetos, por sua vez, gera uma força de reação que impulsiona a serpente para frente.

Alças laterais

Locomoção por alças laterais. Via GIFER

É o mais complexo e interessante método de locomoção, e nem todas as serpentes podem se mover dessa maneira. É usado para rastejar em substratos como lama e areia solta e outras superfícies lisas e escorregadias. Nesse modo, a serpente levanta partes de seu corpo em alças enquanto apoia outras duas ou três partes no solo. As partes erguidas são impulsionadas para a frente e os pontos de contato com o solo são trocados, permitindo que o animal rasteje diagonalmente.

As serpentes também podem erguer certas partes de seu corpo nos casos em que a fricção do ambiente atrapalhem o movimento naturais, e esse tipo de locomoção reduz o contato com o solo permitindo que se movimentem com maior velocidade.

Concertina

Locomoção concertina. Imagens de BIRTH Lab via Gfycat

Há dois tipos de locomoção concertina, a horizontal — usada principalmente em pequenos túneis, e a vertical – quando a serpente precisa escalar árvores muito íngremes, por exemplo. Quando está em locais apertados (como tocas de roedores) e impedida de fazer movimentos de serpentina, pressiona várias partes de seu corpo nas paredes e em seguida se estende impulsionando-se para a frente.

Locomoção retilínea. Via Gfycat

A locomoção de concertina vertical, por outro lado, envolve agarrar ou enrolar o corpo ao redor da superfície e em seguida, esticar a parte posterior para cima. A parte da frente do corpo então repousa e a parte de trás do corpo é enrolada novamente para cima, e assim por diante. Todas as serpentes conseguem fazer o “movimento de concertina”, ou “movimento de sanfona”.

Em 2020, no entanto, foi descoberto que a cobra-arbórea-marrom forma uma espécie de laço com sua cauda amarrando o próprio corpo para conseguir escalar superfícies verticais. Esse comportamento recém-descoberto foi nomeado de “locomoção por laço” — o método foi demonstrado em um artigo publicado em janeiro de 2021 no periódico Current Biology . Este é o quinto tipo de movimento das serpentes reconhecido oficialmente.

Cobra-arbórea-marrom usa a locomoção em laço para subir um objeto vertical.

Cobra-arbórea-marrom usando a locomoção em laço para subir um objeto vertical. Imagem de Julie A. Savidge, Thomas F. Seibert, Martin Kastner e Bruce C. Jayne via Current Biology

Embora não possam escalar árvores muito grandes, a locomoção por laço facilita a escalada de árvores nos limites do comprimento do corpo da cobra, e permite o acesso a presas que não estariam disponíveis para serpentes sem essa habilidade.

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