Migração das aves brasileiras
Anualmente, no outono e na primavera, uma visão incrível aparece no céu noturno de todo o mundo — milhões de pássaros em perigosas e longas jornadas a outros países ou continentes.
Nas Américas, quando o inverno na América do Norte se aproxima, a baixa oferta de alimentos faz com que várias espécies de aves venham à América do Sul, onde o clima é mais quente. Os dias mais longos de verão dão mais oportunidades para as aves se reproduzirem e alimentarem seus filhotes.
Porém, quando os dias ficam mais curtos durante o outono brasileiro, as aves voltam para a América do Norte – onde é verão e os alimentos estão mais abundantes. Nesse mesmo período, as espécies que vivem na Patagônia e Antártida iniciam sua migração para o norte, passando o inverno principalmente nos estados do Sul e Sudeste do Brasil.
Das quase 10 mil espécies conhecidas no mundo, cerca de metade migra, incluindo aves marinhas, aquáticas, pernaltas, rapinantes e passarinhos. No Brasil, das 1.919 espécies atualmente registradas pelo Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos, cerca de 198 são definidas como migratórias, sendo que 36% destas são parcialmente migratórias, ou seja, apenas parte da população migra.
Algumas aves fazem grandes migrações, cruzando os hemisférios; voam por milhares de quilômetros desde o Ártico, cruzando fronteiras em direção à Patagônia (Chile e Argentina), um dos principais lugares em que se reúnem. Um exemplo, é o falcão-peregrino (F.peregrinus tundrius), que voa mais de 20 mil quilômetros sem parar.
As migrações, no entanto, não precisam ser de um continente para o outro. Sendo o Brasil um lugar tão grande e diverso, certas aves podem migrar sem nem mesmo sair do país. As tesourinhas, por exemplo, viajam todos os anos do Rio Grande do Sul para a Amazônia ou para o cerrado. Já os cabeças-secas e os colhereiros , fazem migrações na própria bacia pantaneira, conforme os períodos de cheia.
Na Serra do Mar, os sabiás-unas e sabiás-ferreiros fazem migrações ainda menores, vivendo no alto do morro e descendo para o pé da serra – onde é mais quente. No total, 250 espécies de aves migram sem sair da América do Sul.
Como as aves migram?
As aves sabem quando devem migrar por causa de seus relógios biológicos, que as permite perceber a transição das estações através da diferença na luz e na temperatura do ar. Quando é chegado o momento, as espécies que fazem grandes migrações com poucas paradas buscam acumular gordura suficiente para suportar a longa viagem.
As aves utilizam vários tipos de “bússolas” para se orientarem durantes suas migrações. Das que voam em bandos, uma boa parte migra durante a noite e utiliza as estrelas, o relevo (como rios, árvores ou características do litoral), o instinto e o campo magnético da Terra para navegar. As aves maiores voam através de áreas abertas como campos e oceanos, já as menores (os passarinhos), podem migrar grandes distâncias entre a vegetação.
A maioria migra durante a noite, para minimizar o risco de serem alvos de predadores e evitar o gasto desnecessário de energia voando debaixo do sol. No entanto, algumas aves mais ágeis, como falcões, gaviões e andorinhas , preferem migrar durante o dia. O aproveitamento das correntes de ar permite que percorram grandes distâncias com um gasto mínimo de energia.
Estas espécies se orientam principalmente pela posição do sol, e quando as condições climáticas não são favoráveis, podem mudar o modo que se guiam. Ainda não há um consenso sobre se essa capacidade de navegação das aves em geral é herdada e inata ou aprendida.
Ao longo de sua migração, as aves usam várias áreas para se alimentar, trocar as penas, descansar e conseguir a energia necessária para continuar suas viagens. Sem esses locais, as aves não conseguem chegar aos seus destinos finais, deixando de completar seu ciclo vital. No entanto, algumas são capazes de voar mais de 12 mil quilômetros sem parar — como o faz o maçarico-de-bico-virado .
Conservação
Estudos voltados para a conservação das aves migratórias aumentaram nos últimos anos. Novos avanços tecnológicos, como sofisticados rastreadores GPS e sistemas de detecção de radar, oferecem aos cientistas possibilidades únicas de observar as aves migrantes. Mesmo assim, há uma grande (e às vezes, irreversível) redução de suas áreas de alimentação, descanso e reprodução. Segundo estimativas da BirdLife International feitas em 2014, 40% das aves migratórias em todo o mundo estão sofrendo declínio populacional.
Espécies migratórias podem ter necessidades específicas para sua sobrevivência, precisando que suas áreas de reprodução e de alimentação muitas vezes sejam preservadas por milhares de quilômetros. Se esses lugares forem perdidos ou a qualidade ambiental prejudicada, as populações de aves serão rapidamente afetadas, causando a perda de bandos inteiros ou, em casos extremos, a extinção da espécie.
Mesmo quando a área afetada não é totalmente perdida, pode estar tão degradada que se torna inviável para as aves migratórias. Portanto, é importante reconhecer as áreas mais significativas e criar empenho para a conservação dessas regiões e de seus recursos. Além de compreender como são feitas as migrações e como as aves viajam em diferentes épocas do ano, para planejar ações de conservação de longo prazo.
As aves migratórias realizam conexão entre ambientes, biomas, países, continentes e hemisférios, o que dá ao Brasil um grande compromisso de conservar a biodiversidade. Mas, apesar de o país fazer parte de acordos internacionais relacionados à proteção das aves migratórias e seus habitats, a escassez de conhecimento disponível sobre as necessidades ambientais, suas áreas críticas e rotas é um agravante para a preservação de tais animais.
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