O progresso na interpretação de fósseis
Fósseis têm sido descobertos desde os tempos antigos. Na Grécia, é provavel que crânios de dinossauros com bicos tenham sido a inspiração para a criação de animais mitológicos como grifos; crânios de mamutes como a origem dos ciclopes e basilossauros, seriam as serpentes marinhas.
Da mesma forma, na China, era comum que fósseis de vários dinossauros fossem interpretados como dragões. Muitos outros países também criaram suas próprias lendas baseadas em fósseis que encontraram e tiveram uma interpretação equivocada. Somente durante a Renascença, com o avanço da ciência, entendeu-se que esses ossos pertenciam a animais extintos e não a seres mitológicos.
Com o aumento de muitas descobertas durante o século XIX surgiu a palavra “paleontologia” e, a partir de então, estudos sobre paleontologia e geologia cresceram cada vez mais. Profissionais, sociedades e museus da área foram criados, contribuindo para um rápido crescimento sobre o conhecimento de eras antigas na Terra.
Porém, numa época em que tantas espécies eram desconhecidas e baseando-se apenas em alguns poucos ossos encontrados, era praticamente impossível saber com exatidão a aparência desses animais. Segundo o que se sabia até então, os dinossauros seriam semelhantes aos répteis atuais — escamosos, lentos e de pouca inteligência; andando eretos como cangurus (inclusive alguns que hoje sabemos ser quadrúpedes) e arrastando seus rabos ao caminhar.
Portanto, muitos dinossauros, a princípio, foram interpretados de forma errônea, e muitos permaneceram assim até meados dos anos 90.
Iguanodonte
O megalossauro, o iguanodonte e posteriormente, o hylaeossauro foram os três animais que originaram o termo “dinossauro”. O iguanodonte – nomeado em 1825, foi o segundo dinossauro formalmente reconhecido (logo após o megalossauro), e é um dos casos mais icônicos de interpretações errôneas.
Iguanodonte significa “dente de iguana”. Essa característica fez com que inicialmente a espécie fosse descrita como uma grande iguana com um chifre na ponta do focinho. Mais tarde, descobriu-se que o pequeno chifre era, na verdade, um esporão do polegar dianteiro que provavelmente era utilizado para defesa. Mas, essa não seria a única vez que a garra de um dinossauro seria confundida com um chifre…
Anos depois, sua postura foi alterada, tornando-o bípede — o que o deixou parecido com um hipotético cruzamento entre uma iguana e um canguru. Atualmente, sabe-se que os iguanodontes, principalmente os adultos, preferiam andar como quadrúpedes. No entanto, podiam erguer um pouco as patas dianteiras e caminhar também como bípedes em certos momentos. Mas, definitivamente, não ficavam eretos como cangurus.
Por ser um dos primeiros dinossauros descritos e um dos mais conhecidos, o iguanodonte é um bom indicador das mudanças nas percepções sobre os dinossauros. Suas reconstruções passaram por três estágios: o semelhante a um rinoceronte; em seguida, no início do século XX, foi representado como bípede (mas ainda fundamentalmente reptiliano e usando sua cauda como apoio). No terceiro estágio, após a década de 60, essa percepção foi lentamente derrubada por representações mais próximas da atual, com uma aparência mais ágil e dinâmica.
Diplodoco
Outro dinossauro muito conhecido e inicialmente descrito erroneamente é o diplodoco. Esse enorme saurópode, com até 33 m de comprimento, foi descoberto em 1900. Apesar de ser um dos mais estudados, o crânio completo dessa espécie ainda não foi encontrado.
Até encontrarem pegadas de diplodocos 1930, foi representado arrastando-se no chão, com as pernas afastadas, como as de um crocodilo. Acreditava-se ser improvável que andasse como um mamífero , portanto, ter a postura como a de um crocodilo parecia ser na época, mais realista. No entanto, além de ser fisicamente impossível para um dinossauro desse tamanho conseguir arrastar, seria necessário abrir valas onde quer que fosse para conseguir passar sua grande barriga.
Certos estudiosos, por outro lado, acreditavam que os diplodocos passavam a maior parte de seu tempo parcialmente submersos (assim como outros saurópodes) devido à posição de suas aberturas nasais no topo da cabeça. Além disso, por serem animais imensos, supunha-se que poderiam não aguentar seu próprio peso em terra firme. Apenas em 1951 foi proposto que não seria ser um animal aquático, já que a água pressionaria seu tórax com tanta força que impediria sua respiração.
Posteriormente, mais especulações sobre suas estranhas aberturas nasais surgiram, e até mesmo a hipótese de terem uma pequena tromba como as antas, mas não há evidências para tal afirmação. Ademais, um estudo publicado pelo paleontólogo Lawrence Witmer em 2001, indica que apesar de a abertura nasal estar localizada no topo da cabeça, as fossas nasais desciam até muito mais abaixo, no focinho.
O pescoço dos diplodocos também era descrito como posicionado verticalmente, da mesma forma que o de um cisne — mas isso seria inviável, já que o coração não conseguiria bombear oxigênio suficiente para o cérebro. Portanto, atualmente, todos os saurópodes são descritos com o pescoço na posição horizontal ou em 45°. Além disso, outra mudança em sua representação, é que sua cauda não se arrastava pelo chão como primeiramente afirmado, mas pairava acima do solo como as de outros dinossauros.
Espinossauro
O espinossauro foi um dos maiores predadores terópodes que já existiram. As últimas análises sugerem que pode ter tido até 18 m de comprimento, sendo maior do que um Tiranossauro rex. Desde sua descoberta em 1912, recebeu grande atenção devido às suas vértebras dorsais alongadas verticalmente, diferentes de qualquer outro terópode. Isso inspirou a criação de seu nome, que significa “lagarto-espinha”.
Inicialmente, apenas algumas vértebras e parte da mandíbula inferior foram descobertas e, baseado nisso, o paleontólogo alemão Ernst Stromer descreveu seu crânio (até então incompleto) como “curto e robusto”, similar ao de um dimetrodonte. Atualmente, sabe-se que seu crânio é bem diferente dos de outros terópodes, sendo longo e fino, parecido com o de um crocodilo.
As primeiras hipóteses também sugeriam que o espinossauro deveria ser bípede, com a postura elevada como a de um canguru. Após a década de 70 foi proposto que seria um quadrúpede, mas essa teoria caiu em desuso, já que análises mostraram que não conseguiria girar os antebraços e apoiar suas patas no solo apropriadamente. Além disso, durante muito tempo os espinossauros foram representados com pernas traseiras grandes e fortes para caminhar sobre a terra; e braços longos capazes de agarrar presas.
Apenas em 2014, um estudo de Nizar Ibrahim, Paul Sereno e colaboradores propôs (a partir de novos fósseis) que suas patas eram muito curtas para se mover de maneira eficiente em terra, sugerindo que deveria ser um dinossauro semiaquático. Mas em 2018, uma análise feita pelo paleontólogo Donald M. Henderson descobriu que, mesmo com pernas curtas, o espinossauro deveria ter uma boa locomoção bípede terrestre, pois como em outros terópodes, seu centro de massa ficava próximo aos quadris — e não no meio do corpo, como se acreditava anteriormente.
Em janeiro de 2021, os paleontólogos David Hone e Thomas Holtz publicaram um artigo argumentando que o espinossauro deveria passar muito tempo próximo à água, sendo um animal costeiro, mas que não podia mergulhar ou nadar submerso, já que sua morfologia não era adequada para tal coisa.
Várias espécies de espinossauros já foram descobertas, mas a primeira (espécie-tipo) – Spinosaurus aegyptiacus, descoberta em 1912 — ainda está incompleta e muitos estudiosos e paleontólogos usam como base os ossos de outras espécies para tentar desvendar como era o espinossauro, o que pode causar controvérsias sobre a precisão dos resultados.
Sem dúvida, esses não foram os únicos dinossauros que trouxeram dificuldades técnicas aos paleontólogos. Apesar de atualmente termos certa facilidade em entender a ecologia e morfologia de vários deles, muitos outros ainda estão incompletos e são incompreendidos pelos cientistas. Da mesma forma que, com novos achados, descobrimos que muitos deles eram mais próximos das aves do que dos répteis, pode ser que em alguns anos nossa percepção sobre como eram mude completamente em relação ao que pensamos hoje.
Nos últimos dois séculos houve um grande avanço científico e tecnológico, nos permitindo ter uma ideia cada vez mais precisa de como era a vida desses animais. A cada ano, novas evidências são encontradas e novos estudos são realizados e assim, nossa visão sobre como eram e como viviam se tornará cada vez mais precisa.
Leia mais em:
8 Types of Imaginary Creatures “Discovered” In Fossils
Gideon Mantell and the Discovery of Dinosaurs
On the structure of the jaws and teeth of the iguanodon
On the Habits and the Pose of the Sauropodous Dinosaurs, Especially of Diplodocus
Nostril Position in Dinosaurs and Other Vertebrates and Its Significance for Nasal Function
Paleoneurological evidence against a proboscis in the sauropod dinosaur Diplodocus
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