Tudo Sobre Animais

Características e fatos sobre os cetáceos

Há milhares de anos, durante o Eoceno , quando surgiram a maioria dos mamíferos ancestrais, havia um mamífero carnívoro chamado pakicetus. Assim como as antas e hipopótamos, tinha o hábito de passar a maior parte do tempo dentro da água. Mas ao contrário destes, alimentava-se de peixes e outros pequenos animais.1

Com o passar de milhares de anos, o corpo do pakicetus foi evoluindo e se adaptando cada vez mais a ambientes aquáticos: suas membranas interdigitais estavam ficando maiores, e o animal conseguia segurar a respiração por mais tempo, podendo fazer longos mergulhos e procurar seu alimento em águas mais profundas.

Quando seus membros posteriores já não cumpriam uma função definida embaixo d’água, diminuíram até se tornarem apenas ossos vestigiais.2 Ao mesmo tempo, suas barbatanas caudais e dorsais começaram a surgir.

Gradualmente, as narinas desses antigos cetáceos se transformaram em espiráculos no topo da cabeça. Além disso, alguns também foram adquirindo a capacidade de se comunicar por ecolocalização — tornando-se cada vez mais semelhantes aos cetáceos que conhecemos. Por definição, cetáceos são todos os mamíferos carnívoros totalmente aquáticos, ou seja, todos os botos , golfinhos, toninhas, belugas, narvais e baleias.

Pakicetus inachus

Ancestral dos cetáceos: Pakicetus inachus. Imagem de N. Tamura sob a licença CC-BY-SA via Wikimedia Commons

Há fortes evidências genéticas afirmando que os parentes mais próximos dos atuais cetáceos são os hipopótamos, mas ainda não está claro como esses dois animais vieram do mesmo antepassado.3 Sendo assim, cetáceos e hipopótamos fazem parte do mesmo grupo, chamado Artiodactyla, de qual todos os animais que se apoiam em dois ou quatro dedos fazem parte; como antílopes, porcos, camelos e os ancestrais dos cetáceos, como o pakicetus.

Existem cerca de 88 espécies de cetáceos, das quais 44 podem ser encontradas também em águas brasileiras.4 Os cetáceos são animais extremamente diversos, apesar de muitas espécies habitarem todos os mares, algumas são encontradas apenas em pequenas áreas específicas. Além disso, enquanto a maioria vive em ambientes marinhos, existem alguns que podem viver em água salobra e/ou em água doce, como os botos e o tucuxi.5

Também variam muito em forma e tamanho, podendo ter desde 1,4 m como a vaquita, até 35 m como a baleia-azul, o maior animal que já existiu em todo o mundo — superior em comprimento até mesmo aos maiores saurópodes . Outro fator que exemplifica a diversidade destes mamíferos aquáticos, é que enquanto a maioria pode viver de 20 a 30 anos, as baleias-da-groenlândia podem viver por mais de 210 anos!6

Os cetáceos atuais são classificados em dois grupos de acordo com suas características:

Odontocetos

Falsa-orca

Falsa-orca (odontoceto). Imagem de C. C. Chapman sob a licença CC-BY-ND-NC via flickr

São as cerca de 70 espécies de cetáceos dentados como cachalotes, orcas, golfinhos, belugas, narvais, botos , etc. Apenas os cetáceos desse grupo possuem a capacidade de ecolocalização. Também são os únicos que têm um órgão denominado “melão” posicionado na frente da cabeça, que ajuda a focalizar os cliques da ecolocalização.7

Os odontocetos alimentam-se principalmente de peixes, mas a dieta pode variar segundo a espécie. As orcas se alimentam de pinípedes, tubarões , aves marinhas e inclusive outros cetáceos. Já um dos principais alimentos dos cachalotes são as lulas-colossais , que podem ter mais de 20 m de comprimento.

Misticetos

Baleia-jubarte

Baleia-jubarte (Misticeto). Imagem de Chris Quinn sob a licença CC-BY-ND-NC via flickr

Há cerca de 16 espécies de misticetos, também chamadas de baleias-verdadeiras ou baleias-de-barbatanas. Fazem parte desse grupo baleias como a baleia-azul, a jubarte e a minke. Em vez de dentes, estas baleias possuem inúmeras cerdas que filtram zooplâncton, krill e outros pequenos invertebrados. Muitas baleias-de-barbatanas também possuem pregas na garganta que são estendidas ao se encherem de água durante a captura de alimento, fazendo com que possam ingerir uma quantidade ainda maior de comida.

Em algumas espécies desse grupo, há pequenos e escassos fios de “bigodes” que nascem na ponta do rostro até o espiráculo ou no queixo, principalmente nos indivíduos jovens. Ainda quando os bigodes não são visíveis, em baleias jubartes é possível ver a protuberância de seus grandes folículos capilares na frente do rostro, chamados tubérculos.8 No entanto, a função desses pelos ainda é incerta.

As barbatanas dos cetáceos não são iguais às dos peixes

Comparação entre a barbatana de um peixe e de uma baleia

Comparação dos ossos das barbatanas de um peixe (à esquerda) e de uma baleia (à direita).

O corpo dos cetáceos são de certa forma semelhantes ao dos peixes cartilaginosos, o que pode ser atribuído ao seu estilo de vida e às condições do habitat. No entanto, a barbatana caudal dos peixes é vertical e nadam movimentando-a de um lado para o outro. Nos cetáceos, a barbatana caudal é posicionada horizontalmente, e nadam balançando-a para cima e para baixo.

As funções das nadadeiras caudais e dorsais de peixes e cetáceos são as mesmas: enquanto a nadadeira caudal gera impulso, a nadadeira dorsal serve para manter a estabilidade. Porém, nos cetáceos, estas nadadeiras são constituídas apenas de tecido conjuntivo, sem nenhum osso ou espinhas dentro delas. Por isso, baleias sob estresse, que passam muito tempo fora da água ou que vive em condições inadequadas têm a nadadeira dorsal caída.9

Os cetáceos que vivem em regiões polares como os narvais, belugas e as baleias-da-groenlândia são os únicos que não possuem barbatana dorsal, já que isso os atrapalharia a nadar agilmente debaixo do gelo e aumentaria a perda de calor.10

Já as nadadeiras peitorais contêm ossos das antigas patas das baleias. Elas ajudam a manter a estabilidade e permitem que façam manobras ao nadar. As barbatanas peitorais variam em forma e tamanho e influem na capacidade de nado de diferentes espécies: as com barbatanas menores em relação ao seu tamanho, como as baleias-azuis, são especializadas em nadar lentamente em águas abertas, enquanto espécies com barbatanas maiores como a jubarte, são capazes de nadar mais rápido e manobrar com mais agilidade.

Como os cetáceos respiram debaixo d’água?

Baleia-azul respirando

Ao contrário da maioria dos peixes, os cetáceos têm pulmões e precisam respirar o ar da superfície, inclusive enquanto dormem. Para não se afogarem, os cetáceos sempre estão conscientes de sua respiração, e durante suas horas de sono descansam um lado do cérebro de cada vez, realizando pequenos intervalos e sempre voltando à superfície.11

Ao subirem para respirar, exalam o restante de ar quente de seus pulmões que quando entra em contato com as temperaturas mais baixas da superfície, forma um jato de vapor e partículas de água. Esse é o famoso jato que as baleias espirram pela sua cabeça para fora da água — portanto, não é água, mas ar que se condensa.

Os cetáceos podem ser diferenciados à distância pela forma, ângulo e altura do vapor que se forma ao exalar, principalmente devido ao fato dos odontocetos possuírem apenas um espiráculo, enquanto os misticetos, dois.

Após inalar grandes quantidades de ar, dependendo da espécie, esses animais conseguem prender a respiração por quinze minutos ou até por mais de duas horas.12 O armazenamento de ar nos pulmões dos cetáceos é tão eficaz que trocam rotineiramente entre 75% e 90% do volume total dos pulmões em 0,3 s, em comparação, um cavalo a galope troca apenas 27% em 0,5 s.13

Audição, ecolocalização e vocalização

Belugas

Belugas. Imagem de sk8mama sob a licença CC-BY-ND-NC via flickr

Os mamíferos marinhos geralmente possuem um ótimo sentido de audição. Seus ouvidos são capazes de ouvir uma ampla gama de sons e identificar exatamente de qual direção ele vem.

Para fins comparativos, os humanos podem ouvir frequências entre 20 Hz e 20 kHz. As baleias-de-barbatanas podem ouvir frequências sonoras tão baixas quanto 7 Hz e tão altas quanto 30 kHz. Já os odontocetos ouvem uma faixa ultrassônica muito mais ampla do que os humanos e os misticetos, variando de 150 Hz à 180 Khz.14

Além disso, os odontocetos são capazes de usar a ecolocalização para discernir entre presas e não presas (como humanos ou barcos) analisando tamanho, forma, características da superfície, distância e movimento de um objeto. Dessa forma, conseguem se orientar apenas pela ecolocalização e capturar presas até mesmo nas partes mais escurando do oceano.15

A ecolocalização é usada gerando uma série de sons de alta frequência, chamados “cliques”, que são direcionados na direção em que a cabeça está apontando. Quando as ondas sonoras dos cliques atingem um alvo, são rebatidas e transmitidas para os ouvidos e o cérebro dos golfinhos, botos e demais baleias dentadas.

As baleias de barbatanas, no entanto, não possuem as características físicas necessárias para gerar cliques de ecolocalização.16 Além disso, não seria nada prático localizar milhares dos minúsculos organismos dos quais se alimentam com ecolocalização. Ou seja, as misticetos não possuem ecolocalização porque não lhes seria útil.

Além dos cliques de alta frequência, os odontocetos desenvolveram maneiras sofisticadas de se comunicarem através de assobios e outros chamados.14 Emitindo sons específicos, podem transmitir mensagens relacionados ao descanso, comportamento sexual, viagem, aviso ou alimentação.

Esses cetáceos se comunicam dentro de seu próprio grupo emitindo uma série de chamados que constituem um verdadeiro “dialeto”, ensinado às novas gerações e tornando as comunicações vocais do grupo mais eficientes.17 Alguns golfinhos, como o golfinho-nariz-de-garrafa, emitem assobios característicos, chamados “assobios de assinatura”, que identificam cada espécime. O fato de os golfinhos terem algo semelhante a um nome é algo único no reino animal.18

Apesar de tamanha habilidade em criar tais chamados, os odontocetos não conseguem produzir os sons longos como os conhecidos cantos das baleias. Em contrapartida, os misticetos não produzem cliques ou chamados específicos, em vez disso, os machos emitem longos sons de baixa frequência que podem ser sentidos por vários quilômetros.

Canção de uma baleia-jubarte. Audio de madmatrix sob a licença CC-BY-NC via iNaturalist

As jubartes emitem sons de frequência variável que formam autênticas “canções” que duram entre sete e trinta minutos e depois são repetidas. Não há pausa entre uma canção e outra, portanto podem continuar cantando por horas. As canções são compostas por uma série de temas, frases e sub-frases, e há diferenças entre as canções das jubartes que vivem no Atlântico, no Pacífico e no hemisfério sul.19

Suas canções desempenham um papel importante principalmente na época de reprodução, comunicando a sua disponibilidade para acasalar e a sua posição.20 As baleias-azuis e outras espécies de misticetos também podem cantar, mas de forma muito mais simples.

Todos esses sons não são produzidos por cordas vocais — já que os cetáceos não as têm. Nos odontocetos, são produzidos através de pequenas estruturas chamadas lábios fônicos que ficam localizadas em suas cabeças,21 já os misticetos produzem sons através de estruturas homologas às cordas vocais, mas modificadas.22

Relações sociais

Interação entre golfinhos e jubartes

O principal meio pelo qual os cetáceos se comunicam é a produção de sons. Porém, a linguagem corporal e sensações táteis também são muito comuns e desempenham um papel importante. No entanto, o comportamento lúdico como saltos aéreos, cambalhotas, surf ou pancadas de barbatanas, ocorre mais frequentemente em cetáceos menores, como golfinhos, belugas e botos .

Embora algumas espécies vivam em pares ou sejam solitárias, a maioria dos cetáceos são animais sociais. Os misticetos geralmente não formam grandes grupos e muitas vezes o nível mais alto de organização social é a associação temporária de uma fêmea com seus filhotes. Mas as jubartes podem formar grupos para caçar.

O comportamento social dos odontocetos são mais complicados e articulados. Muitas espécies formam associações de longo prazo, mais ou menos complexas. Um grupo, geralmente consiste entre dez e cinquenta animais, mas ocasionalmente, com a disponibilidade em massa de alimentos ou durante a época de acasalamento, os grupos podem abranger mais de mil indivíduos.

Em alguns casos, golfinhos-riscados, belugas e até mesmo os cachalotes podem formar associações interespecíficas com outros odontocetos.23

Ameaças e conservação

Pintura representando a caça às baleias

Pintura representando a caça às baleias. Imagem de Wally Gobetz sob a licença CC-BY-NC via flickr

Estes animais marinhos dependem criticamente do som para viver e desempenhar várias funções vitais. O oceano é um lugar naturalmente barulhento, mas os seres humanos fazem uma série de sons que estão cada vez mais interferindo no ambiente, e há evidências claras de que alguns desses sons podem impactar negativamente a vida marinha.

O ruído pode induzir alterações no comportamento, na comunicação ou na capacidade de orientação. Além disso, o barulho de navios, o uso de sonar de alta intensidade e estudos sísmicos que buscam petróleo e gás natural, podem causar danos temporários ou permanentes no sistema auditivo dos cetáceos, podendo inclusive causar sangramento auditivo, levando-os à morte.14

Outros fatores que os ameaçam é a poluição dos mares e o aquecimento global que pode destruir toda a cadeia alimentar destes animais e resultar na diminuição de seus números.24 25 A pesca acidental por redes de pesca também é uma ameaça principalmente para os odontocetos menores: segundo um estudo de 2003, mais de 300 mil espécimes morrem afogados todos os anos após ficarem presos em redes.26

Apesar de a caça não ser tão extrema como nos últimos séculos, milhares de golfinhos ainda são capturados em caçadas anuais em diversos lugares do mundo como nas Ilhas Salomão, nas Ilhas Faroé, no Peru e no Japão. A prática de natureza controversa, tem resultado em críticas internacionais e no possível risco à saúde que a carne frequentemente poluída causa, além de evidentemente ter grande influência na extinção de tais espécies.27 28

Desde 1974, o Brasil faz parte da CIB (Comissão Internacional da Baleia) e proíbe a caça e o molestamento de todos os cetáceos em águas territoriais. Em 2008, as águas que fazem parte do território brasileiro foram formalmente decretadas como santuário de baleias e golfinhos.9

Leia mais em:


  1. Indian Academy of Sciences - The origin and early evolution of whales - macroevolution documented on the Indian Subcontinent  ↩︎

  2. Land-to-sea transition in early whales: evolution of Eocene Archaeoceti (Cetacea) in relation to skeletal proportions and locomotion of living semiaquatic mammals  ↩︎

  3. Nature - Whales originated from aquatic artiodactyls in the Eocene epoch of India  ↩︎

  4. ResearchGate - Diversidade e distribuição de cetáceos na área de influência das atividades de E&P na Bacia de Campos  ↩︎

  5. Biota - Cetáceos de rios ou golfinhos de água doce  ↩︎

  6. BBC - The secrets of living to 200 years old  ↩︎

  7. ResearchGate - Morphology of the melon and its implications for acoustic function  ↩︎

  8. Greelane - Onde as baleias têm cabelo e como ele é usado  ↩︎

  9. ThoughtCo - Killer Whale Dorsal Fin Collapse  ↩︎

  10. WDC - Arctic Adaptations  ↩︎

  11. Scientific American - How do Whales and Dolphins Sleep Without Drowning?  ↩︎

  12. National Geographic - Baleias não borrifam água de seus espiráculos — e outros mitos desmentidos  ↩︎

  13. Online Library - A review of cetacean lung morphology and mechanics  ↩︎

  14. UN Biodiversity - Marine Mammal Hearing and Sensitivity to Acoustic Impacts  ↩︎

  15. Britain’s Sea Mammals: Whales, Dolphins, Porpoises, and Seals and Where to Find Them  ↩︎

  16. New World Encyclopedia - Echolocation  ↩︎

  17. PNAS - Bottlenose dolphins can use learned vocal labels to address each other  ↩︎

  18. PNAS - Signature whistle shape conveys identity information to bottlenose dolphins  ↩︎

  19. Sciece- Songs of Humpback Whales: Humpbacks emit sounds in long, predictable patterns ranging over frequencies audible to humans.  ↩︎

  20. Springer Link - Interactions between singing Hawaiian humpback whales and conspecifics nearby  ↩︎

  21. ResearchGate - A Phenomenon Discovered While Imaging Dolphin Echolocation Sounds  ↩︎

  22. American Association for Anatomy - Discovery of a low frequency sound source in Mysticeti (baleen whales): Anatomical establishment of a vocal fold homolog  ↩︎

  23. Good News Network - A Pod of Whales Adopted a Young Stray Narwhal – and They May Have Little ‘Narwhales’  ↩︎

  24. Aula Zen! - Um grande número de baleias cinzentas morrem de fome e morrem no leste do Pacífico Norte – ScienceDaily  ↩︎

  25. Terra- Orcas do Pacífico estão morrendo de fome  ↩︎

  26. Publico - Milhares de baleias e golfinhos morrem afogados nas redes de pesca  ↩︎

  27. The Washingtton Post - Why more than 15,000 dolphins have been killed in Solomon Islands drive hunts  ↩︎

  28. Exame - Mais de 1.400 golfinhos são mortos em um único dia de caça na Europa  ↩︎

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